Ser digital - Como criar uma presença on-line marcante”: branding aplicado às nossas vidas pessoais

[A] transformação digital chegou às pessoas, a cada um de nós, invadindo o nosso dia-a-dia. Desta forma, cada indivíduo procura, cada vez mais, como construir de forma sustentada e consistente a sua identidade digital, seja por razões profissionais, seja como hobby.


O que é o branding pessoal?

Se pesquisar o seu nome completo no Google, o que aparece? Experimente agora fazê-lo usando uma pesquisa de frase completa incluindo o seu nome entre aspas. Continue a experimentar as diferentes variações do seu nome para ver todo o tipo de resultados associados.

Entre posts nas redes sociais, as conferências em que participou, as notícias onde apareceu ou as competições de matemática que ocasionalmente ganhou há demasiados anos para se lembrar de que isso tinha acontecido. Se escrever artigos, eles também aparecerão. Todas as suas opiniões, toda a sua existência digital é monitorizada e apresentada a quem pesquise o seu nome.

Quer seja para um primeiro encontro ou para uma entrevista de emprego, viu quão fácil é descobri-lo no Google e as primeiras impressões continuam a ser impossíveis de apagar, os seus efeitos prolongam-se no tempo – tenha a certeza de que o que mostra ao mundo é algo que o distingue e que reflete quem realmente é.

Enfim, o branding pessoal pode ser definido como a combinação única de capacidades e experiências que o tornam quem é. Se decidir seguir práticas de melhoria e curadoria da sua presença digital, pode diferenciar-se da competição e construir confiança para os potenciais clientes ou empregadores. Utilizando as palavras de Jeff Bezos, “a sua marca é o que as pessoas dizem sobre si quando não está na sala”, exceto que agora temos que extrapolar isso para um mundo onde todas as pessoas podem participar na conversa e nós não podemos sair da sala.

Book Review

O que me fez escrever todo este artigo sobre branding pessoal? Creio que é possível que a existência de uma inspeção constante de tudo o que fazemos se venha a tornar um debate semelhante ao debate sobre a partilha de dados. Onde acaba a nossa liberdade no mundo digital?

Mas, para além disso, li recentemente um livro muito interessante para quem se quer dedicar ao desenvolvimento da sua marca pessoal on-line: “Ser Digital – Como criar uma presença on-line marcante” de Carolina Afonso e Sandra Alvarez, profissionais no setor do Marketing Digital.

Com uma forma de escrever simples e eficaz, sem grandes floreados ou figuras de estilo, este livro é ideal para obter uma perspetiva imparcial sobre o que é o personal branding e como podemos começar a explorar os conceitos associados a este sem formação prévia.

As autoras dividem o livro em capítulos sucintos, mas cujo conteúdo é mais do que suficiente para conseguirmos pensar criticamente sobre a nossa presença on-line: identidade, credibilidade, storytelling, autenticidade, partilha, sinergias on-line e offline, timing e otimização. Para além disso, o livro oferece dicas sobre que tipo de plataformas usar para facilitar a organização do nosso mundo digital, como medir a influência e interatividade que geramos e apresenta, para cada capítulo, entrevistas a caras do mundo do Marketing Digital, pessoas associadas a marcas enormes e aos engenheiros atrás dos algoritmos que comandam as nossas vidas digitais

O livro passa a mensagem mais importante de todas: a única característica que nos diferencia verdadeiramente é a autenticidade. Não vale a pena vivermos num mundo digital construído sobre premissas falsas, nem partilharmos ou escrevermos sobre assuntos que nos parecem corretos – apesar das métricas, algoritmos, truques ou hacks de crescimento – há algo que governará sempre a informação que selecionamos: a nossa humanidade, a procura dos nossos pares e opiniões que nos pareçam genuínas.

Então, mas isto serve para todos?

A criação de uma ‘marca’ pessoal traz, definitivamente, um conjunto de vantagens extraordinário:

  • Ajuda a distinguir-nos da multidão;
  • Leva a novas oportunidades (novos empregos, estágios, conferências, eventos de networking e parcerias, entre outras);
  • Inspira confiança à audiência que pesquisa sobre nós;
  • Ajuda a alcançar objetivos e visibilidade.

Mas, como nos mostram outros autores como Louise Fletcher ou Sadhbh O’Sullivan, há que entender o que verdadeiramente é o branding pessoal, corroborando a mensagem de autenticidade que o livro foca.





Branding pessoal NÃO é o mesmo que Image-making

Comumente, há uma conceção errada do que significa o branding pessoal e quando se explica às pessoas a necessidade de ter uma presença digital boa, o normal é que ouçam “criar uma imagem minha que acho que vai vender melhor” em vez de “comunicar aquilo que me torna valioso e único no mundo” . Enquanto a segunda é autêntica e se baseia em sucesso genuíno, a primeira cria o monstro do sucesso temporário, apenas enquanto conseguimos manter a fachada que construímos. Devemos usar as dicas que nos dão para garantir que a nossa presença digital não mostra algo que não somos e curá-la como se de uma galeria sobre a nossa vida se tratasse , mas nunca podemos construir sucesso baseado numa mentira.


NÃO sejas o que os outros querem

Vivemos numa era de autopoliciamento constante, quer consciente ou subconscientemente, que faz parte da experiência que todos temos com as redes sociais.

Sentimos que precisamos de um nível elevado de omnipresença em todos os canais e o que foi, em tempos, uma noção criada com o objetivo de progredir numa carreira profissional é, atualmente, o mesmo tipo de comportamento que temos com a nossa vida na internet.

Acabamos por perder a possibilidade de fazer erros, de mudar de opinião e somos desumanizados porque facilmente perdemos aqueles que ‘compram’ (de novo a ideia errada do que é o personal branding) o nosso perfil, as nossas ideias e a forma como as transmitimos que se sentem ofendidos com mudanças que os obrigam a repensar as suas próprias ideias ou que não seguem uma norma ‘politicamente correta’ naquela audiência em particular.

Não esqueçamos que, por mais que digamos a nós mesmos que estamos a ser autênticos, toda a experiência digital é desenhada para nos afastar da verdadeira autenticidade. Mostramos apenas os nossos melhores momentos, usamos linguagem em que amigos se perdem para seguidores e onde a performance da nossa participação fundamentalmente subjetiva e humana é avaliada em métricas numéricas objetivas (por exemplo, o número de likes).

Hoje, a norma é que sejamos o entretenimento uns dos outros e que o nosso principal objetivo sejam as interações com o nosso produto – que somos nós. O espaço social na internet precisa da nossa contribuição para poder melhorar, estamos ainda no início do que se pode tornar um gatilho para algo muito bom ou muito destrutivo.

Existem algumas dicas que podem ajudar a mantermos uma verdadeira sensação de identidade autêntica on-line, ainda que não estejamos preparados para a mostrar a toda a gente:

  • Criar um ‘finsta’ (um perfil secundário com um público selecionado entre os nossos amigos mais próximos) para postarmos algo não curado e não filtrado;
  • Lentamente, deixar de lado alguns medos através de posts simples que abrem portas para outras partes da nossa vida, como mostrar interesse nos chamados ‘guilty pleasures’ como aquela série que não é considerada ‘fixe’, mas que adoramos ver;
  • Criar limites específicos entre a presença on-line e o resto da nossa vida, de forma a que se entenda facilmente que as redes sociais são apenas uma das várias versões de uma pessoa e que é impossível conhecer alguém tendo apenas acesso às suas redes.

Há uma imensidade de outras questões que precisam de ser colocadas e que se prendem com a implicação de que o branding pessoal é como um trabalho constante de curadoria das nossas vidas pessoais.

É correto sermos embaixadores das empresas onde trabalhamos? O que se passa com a cultura de cancelamento? Estamos presos a uma imagem estática que criamos de nós mesmos? Estamos presos ao que dizemos, ao que postamos? Podemos ir além do que achamos que as outras pessoas querem ouvir ou seremos tomados como idiotas? A nossa vida tem que ser escrutinada por todos? Com que direito misturam as diferentes faces da nossa vida pessoal com a vida laboral?

Acima de tudo, até onde vamos antes que a perfeição instagramável nos destrua?





Bárbara Vitorino

Bibliografia

Wook. 2020. Ser Digital – Como criar uma presença on-line marcante. Disponível aqui

Castrillon C. (fevereiro, 2019). Why Personal Branding Is More Important Than Ever. Forbes. Disponível aqui

Heitzman A. (setembro, 2019). What Is Personal Branding & 4 Reasons Why It’s Important. Search Engine Journal. Disponível aqui

Kunsman T. (dezembro, 2018). Why You Need to Develop A Powerful Personal Brand Identity at Work. Everyonesocial. Disponível aqui

Fletcher L. The Problem with Personal Branding. Blue Sky. Disponível aqui

O’Sullivan S. (março, 2020). How To Leave The Exhausting Idea Of A ‘Personal Brand’ Behind. Refinery 29. Disponível aqui